O primeiro encontro da série "Pacto Federativo para Agenda 2030" discutiu caminhos possíveis para o protagonismo dos governos locais na agenda do desenvolvimento sustentável
Não é nenhuma novidade que o atual Pacto Federativo brasileiro apresenta entraves para o desenvolvimento do país. Especialistas e representantes da sociedade civil, da academia, do poder público e diversos setores da sociedade vem nos alertando há anos sobre a necessidade de revisá-lo, levando em consideração os atuais desafios e necessidades impostos ao poder executivo nas diferentes esferas de governo. Esse complexo arranjo político que reconheceu em 1988 a autonomia dos municípios, dando às prefeituras uma série de competências e atribuições para o desenvolvimento local, não foi suficiente para fazer com que os recursos públicos chegassem ao território, promovendo maior qualidade de vida e bem-estar para população.
Essa é uma agenda que vem ganhando destaque nos últimos dias com as PECs apresentadas pelo Governo e que prometem destinar mais recursos para os governos subnacionais, ainda que, na distribuição do bônus por assinatura do Pré-Sal, em outubro, apenas 33% tenham sido destinados para Estados e municípios, no lugar dos 70% prometidos por Paulo Guedes.
O tema ganha ainda mais relevância no contexto das eleições municipais que acontecerão em 2020. O estrangulamento de estados e municípios coloca a sua saúde fiscal e a responsabilidade pelas contas públicas no centro de debate sobre o Pacto Federativo e, principalmente, sobre a capacidade de realizarem os urgentes investimentos em infraestrutura e políticas públicas. Os municípios são responsáveis por 36,3% dos investimentos públicos no Brasil, ainda assim, 70% dependem em mais de 80% de receitas "externas" (transferências), enquanto 33% não geram receitas suficientes para financiar sua estrutura administrativa.
Com a população brasileira, principal contribuinte do orçamento público, alheia a esse debate, a oportunidade de se construir no Congresso nos próximos meses uma reforma política e fiscal que ajude o Brasil a trilhar os rumos do desenvolvimento sustentável pode se distanciar ainda mais da realidade. A descentralização do poder e dos recursos, fortalecendo o papel dos governos locais e dos cidadãos e cidadãs, é fundamental para implementar políticas públicas de maneira eficiente e transparente. Foi pensando nisso que um conjunto de organizações da sociedade civil e da academia que trabalham pelo aprimoramento da democracia no Brasil lançou a iniciativa "Pacto Federativo para Agenda 2030".
"A agenda do desenvolvimento sustentável e de enfrentamento da emergência climática global não está mais em negociação. Agora ela precisa ser não só um compromisso do Estado brasileiro, mas um guia para governadores e prefeitos. Se os recursos destinados a estados e municípios não forem utilizados para incentivos e investimentos em soluções sustentáveis, baseadas na natureza, com baixa emissão de carbono e que promovam inclusão social e segurança ambiental, o Governo e Congresso vão demonstrar a incapacidade de inovação nas altas esferas do poder público, pois a nível local e em diversos estados e municípios brasileiros, a população, os gestores públicos e o setor privado já encontraram formas de fazer diferente e fazer melhor", afirma Carolina Mattar, Coordenadora Executiva do IDS, uma das organizações responsáveis pela iniciativa.
Diversos mecanismos e arranjos alternativos vêm sendo testados por estados e municípios para garantir que os instrumentos econômicos e de gestão fomentem a melhoria de índices de desenvolvimento socioeconômico, como é o caso do ICMS ecológico de Santa Catarina ou do Fundo Municípios Verdes do Pará. Soluções como essas foram debatidas no 1º encontro da iniciativa "Pacto Federativo para Agenda 2030", que aconteceu no dia 26 de novembro em São Paulo.
O primeiro seminário "O papel dos governos locais frente à crise climática" deu início a um ciclo de 5 encontros e contará com a presença de representantes da Associação Brasileira de Municípios (ABM), do Consórcio Interestadual do Nordeste, da ONU-Habitat, do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), da Firjan (Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro), do Instituto Arapyaú, além de outros representantes do poder público e nomes da academia e do setor privado. A iniciativa é promovida pelo Instituto Democracia e Sustentabilidade - IDS, o Instituto de Estudos Avançados da USP, o ICLEI - Governos locais pela Sustentabilidade, o Instituto Ethos, o Escolhas e o Programa Cidades Sustentáveis, com o apoio da Unibes Cultural.